sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Literatura privada

Passei meu tempo de literatura privada, íntima. E o silêncio impõe-me responsabilidades. Faz-me estremecer esta que ora tenho nas mãos, a obrigação moral de ser útil, quase proverbial, no que vou dizer aqui, obrigação filha do silêncio guardado e resguardado nas privacidades. Dizem que os sábios são sujeitos de poucas palavras, poucos verbos, poucos adjetivos. E seus poucos verbos são todos imperativos enquanto conjugados, passivos, em seu silêncio. Quisera eu ser assim, quisera eu ter sido assim. Faz-me estremecer ainda mais, então, a responsabilidade que ora tenho nas mãos, a obrigação de oferecer aqui a quem quiser, sem triagens, uma possível sabedoria que tenha recolhido de meu silêncio. Parece-me impossível e inclino-me a deixar aqui o que tenho de trivial, banal e, talvez, profano. Falo a partir da razão, é onde residem minhas imprecisões. A fé não fala, é sábia, faz silêncio.

Começo pedindo perdão por meus adjetivos, imprecisos como sempre. Escapo sempre das exatidões científicas, das certezas experimentais. A vaguidão é geralmente meu lugar preferido, a lógica da indefinição me fascina. Foi disso que meu silêncio nasceu e foi isso que ele produziu, mais uma indeterminação, mais uma sombra sobre as clarividências que me serviam de premissas (mais uma imprecisão).

Meu primeiro passo foi render-me ao medo do não-silêncio. Deixei-o vencer, oportunamente, e tornar-se esperança. O não-silêncio prevaleceu e eu soube silenciar. Encontrei aí, em minha obscuridade, na presença do inimigo cuja vinda tornara-se esperança e, portanto, a chegada tornara-se satisfação, a divindade que temia não encontrar. As trevas e o ruído, a agitação e a dispersão, meu caos, eram, milagrosamente, o lugar epifânico de minha divindade sem nome (outra imprecisão).

Chamo-o Jesus, porém, embora jamais um nome lhe poderia servir. Deus salva, eis a epifania que pude contemplar. Salvou-me de meu caos habitando nele e fez dele sua ordem, minhas trevas, sua luz, minha ignorância, sua sabedoria. Eu jamais saberia nomeá-lo, para mim seria sempre meu Deus sem nome, mas Ele quis chamar-se assim, Jesus, Filho do Deus Vivo, esplendor do Pai, luz eterna, rei da glória, sol da justiça, filho da Virgem Maria, Jesus, conselheiro admirável, Deus forte, pai da eternidade, príncipe da paz, Jesus todo-poderoso, paciente, obediente, manso e humilde de coração, Jesus, pai dos pobres, glória de vossos fiéis, bom pastor, luz verdadeira, sabedoria infinita, imensa bondade, nosso caminho e nossa vida.

Concluo.